FELIPE SELIGMAN
site uol.com.br
DE BRASÍLIA
Diante do agravamento no conflito entre índios e
fazendeiros no sul da Bahia, o STF (Supremo Tribunal Federal) retomou o
julgamento de uma ação que envolve a área em disputa e reconheceu, por 7 votos
a 1, que o local é uma área indígena, determinando a anulação dos títulos de
terras existentes no local.
Os fazendeiros terão de deixar o local, mas a forma
como será a retirada ficará a cargo da União, que definirá, inclusive, se eles
poderão receber indenizações por perderem o registro de suas propriedades.
A ação julgada nesta quarta-feira (2) foi proposta
pela Funai (Fundação Nacional do Índio) em 1982, pedindo a declaração de
nulidade de todas as propriedades de não índios que estivessem dentro da
chamada Reserva Indígena Caramuru/Catarina/Paraguaçu.
A área, localizada no Sul da Bahia, tem 54 mil
hectares e abriga os índios pataxós hã hã hãe. Na época em que entrou com a
ação, há 30 anos, a Funai pediu a anulação que 396 propriedades. Um laudo feito
por técnicos do STF, no entanto, constatou que boa parte daqueles registros
estaria fora da reserva e a validade não estaria, portanto, em questão.
O caso começou a ser julgado em 2008, quando o
relator do caso, o hoje aposentado Eros Grau, votou pela nulidade dos títulos
de terra. Ontem, o caso foi retomado com o voto da ministra Cármen Lúcia.
Além de Eros e Cármen, votaram pela anulação dos
títulos concedidos dentro da reserva indígena os ministros Joaquim Barbosa,
Rosa Weber, Cezar Peluso, Celso de Mello e Carlos Ayres Britto.
Apenas Marco Aurélio Mello votou contra o pedido da
Funai, por entender que os atos de concessão das terras foram feitos em
"boa fé". Ele também argumentou que boa parte dos índios que vivia lá
deixou, com o passar do tempo, a região.
Luiz Fux, por ter substituído Eros Grau, não pode
votar, enquanto Gilmar Mendes e José Antonio Dias Toffoli estavam impedidos por
terem atuado na causa quando ocuparam o cargo de advogado-geral da União. Já o
ministro Ricardo Lewandowski não participou do julgamento por estar na Suíça,
representando o tribunal.
O voto vencedor foi liderado pela ministra Cármen
Lúcia. Ela afirmou que o processo era composto de 25 volumes repletos de
"sofrimento, lágrimas, sangue e morte".
A ministra lembrou que foi exatamente a disputa
sobre essa área que trouxe o índio Galdino a Brasília, em 1997. Naquele ano,
ele foi queimado vivo por adolescentes de classe média, quando dormia em uma
parada de ônibus e acabou morrendo.
De acordo com Cármen Lúcia, os índios pataxó hã hã
hãe já ocupam cerca de 42 mil hectares do total e que a área da disputa se
restringe aos 12 mil hectares restantes. Nos últimos anos, alguns fazendeiros
já deixaram o local, após o recebimento de indenizações.
Em seu voto, ela ainda observou que das 396
propriedades inicialmente questionadas pela Funai, apenas 186 estariam dentro
da reserva indígena e somente essas foram anuladas.
Segundo a ministra, a própria Funai e a AGU
(Advocacia-Geral da União) chegaram a reconhecer que não havia a certeza
absoluta sobre todas as propriedades que estariam dentro da área questionada.
A área em questão foi demarcada em 1938, mas nunca
chegou a ser homologada pelo Governo Federal. Para os ministros, no entanto, o
fato não impede que o território seja considerado indígena.
CONFLITO
No último fim de semana, o conflito deixou um morto
e um ferido a bala e fez com que a Polícia Federal enviasse para a região o COT
(Comando de Operações Táticas), uma "tropa de elite" que atua na
contenção de distúrbios.
Exatamente por isso, o STF decidiu julgar o caso,
que não estava na pauta. No início da sessão desta quarta-feira, que deveria
analisar uma ação contra o Prouni, Cármen Lúcia pediu a palavra e argumentou
que, apesar de não estar agendado, o caso deveria ser julgado com urgência pela
situação de "extremo conflito".
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